Publicar ou não publicar? – esta é a questão sobre a qual alguns meios de comunicação social norte-americanos agora se debruçam. Trata-se de um relatório que confirma que Donald Trump está “nas mãos” de Vladimir Putin.
Apenas uma hora depois de a CNN ter noticiado que os serviços secretos dos Estados Unidos da América entregaram a Donald Trump e Barack Obama, na passada semana, um relatório que denunciava que a Rússia teria informações pessoais e comprometedoras sobre o Presidente eleito dos EUA, mas cujo conteúdo não divulgou, o site noticioso BuzzFeed publicou o documento na íntegra.
A questão é que tanto a CNN, como depois o The Guardian, tinham tido o cuidado de não entrar em pormenores sobre o conteúdo e de realçar que os relatos russos continham informação que não era possível confirmar – até mesmo o FBI estava ainda a tentar apurar a sua credibilidade. As informações teriam sido compiladas por um antigo operacional de informação britânico que cooperava com as agências norte-americanas e, apesar das dúvidas, os serviços secretos decidiram incluí-las no relatório para Trump e Obama, de forma a que o Presidente eleito estivesse a par dos riscos de uma possível divulgação comprometedora por parte de Moscovo.
Quando decidiu tornar público o documento, o BuzzFeed fez a mesma ressalva sobre as dúvidas acerca da informação – “as alegações não são verificadas e o relatório contém erros”, avisou, numa nota que acompanha as 35 páginas -, mas ainda assim colocou-o no seu site: “Publicamos o documento completo para que os americanos possam decidir por si sobre as alegações acerca do Presidente eleito que circularam ao mais alto nível do Governo dos EUA.”
E nas horas seguintes, nas suas caixas de comentários e também nas dos meios de comunicação social que noticiaram a existência do relatório sobre a informação russa, iniciou-se um debate sobre essa divulgação quando há sérias dúvidas sobre a veracidade dos dados e até os serviços secretos admitem não conseguir confirmá-los.
E tornou-se de tal forma intenso que horas depois o director do BuzzFeed se sentiu obrigado a vir a público explicar-se. “Publicar este documento não foi uma decisão simples, e as pessoas de boa vontade podem até discordar da nossa escolha. Mas publicar este dossier reflecte o modo como vemos o trabalho dos repórteres em 2017”, argumentou Ben Smith, que insistiu haver “sérias razões para duvidar das alegações” constantes no relatório.
“Até mesmo Donald Trump merece justiça jornalística”, escreveu no Twitter o jornalista David Corn, que em Outubro noticiou a existência de relatórios (mas não o conteúdo) que indicavam a “ajuda” russa à campanha de Trump. “Não é assim que o jornalismo funciona: ‘Aqui está uma coisa que pode ou não ser verdade, sem provas evidentes; decida por si se é legítimo’”, reagiu Brad Heath, repórter de investigação do USA Today.
O director-executivo do The New York Times, Dean Baquet, contou que o jornal não publicou o documento por este conter dados “absolutamente não comprovados”:“Nós, como os outros media, investigámos as alegações e não as conseguimos comprovar. Não estamos no negócio de publicar coisas cuja veracidade não conseguimos sustentar.”
“É raro que uma história cheire mal de todos os ângulos possíveis: a fonte, o conteúdo, as consequências, o mensageiro, o alvo”, escreveu no Twitter, por seu turno, o director da Condé Nast International, Wolfgang Blau, também um ex-Guardian.
Mas houve também aplausos: o presidente da ProPublica, uma redacção independente de jornalistas de investigação, Richard Tofel, apoiou a decisão do BuzzFeed, afirmando que os cidadãos “devem ter provas para julgarem por si”. E o blogue LawFare, que diz ter tido os documentos e preferiu não divulgar, mas defendeu que as alegações, embora por provar, devem ser levadas a sério pois a atitude negacionista de Trump sobre a “mão” russa no processo eleitoral começa a levantar suspeitas e são já demasiadas as referências a possíveis intervenções do país liderado por Putin.
In: Público